O grande interesse despertado pelo traumatismo abdominal está em função da sua elevada freqüência, dificuldade no diagnóstico, especialmente na contusão do abdome e das particularidades terapêuticas.
A incidência dos traumatismos vem aumentando progressivamente e sua gravidade é determinada pela lesão de órgãos ou estruturas vitais do abdome e pela associação com outras lesões, principalmente crânio e tórax.
De acordo com o agente agressor são classicamente divididos em ferimentos abdominais quando apresentam solução de continuidade na parede e contusões abdominais quando o traumatismo é fechado sem solução de continuidade, podendo ou não apresentar lesão visceral associada intra ou retroperitoneal.
Os ferimentos são ditos penetrantes quando produzem perfuração do peritônio parietal, penetrando na cavidade abdominal estando ou não associados a lesões internas.
Avaliação
História
Pormenores do acidente são particularmente úteis na avaliação inicial do portador de trauma fechado multissistêmico e nas lesões penetrantes. O paciente, quando consciente, é quem melhor presta essa informação. O pessoal do resgate e a polícia também podem fornecer detalhes importantes sobre o momento e o mecanismo do acidente, os dados referente à avaliação inicial do paciente e sua resposta ao tratamento, etc.
Exame Físico
• Inspeção
O paciente deve estar completamente despido. As faces anterior e posterior do abdome, o tórax inferior e o períneo devem ser inspecionados em busca de escoriações, contusões, lacerações e ferimentos penetrantes. O paciente deve ser cuidadosamente rolado para permitir o exame completo do dorso.
• Ausculta
O abdome deve ser auscultado para a avaliação dos ruídos hidroaéreos. A presença de sangue ou conteúdo intestinal pode acarretar íleo, resultando na ausência dos ruídos. Contudo, o íleo também pode ocorrer em conseqüência de traumas extra-abdominais, como fraturas de costelas, coluna ou pelve.
• Percussão
A percussão do abdome após o trauma tem por objetivo primário verificar, de forma sutil, se existe dor à descompressão brusca. Esta manobra determina pequenos deslocamentos do peritônio e produz uma resposta similar à obtida quando o paciente tosse.
• Palpação
A palpação abdominal fornece informações subjetivas e objetivas. As primeiras consistem da avaliação, pelo próprio paciente, da localização e intensidade da dor. A dor inicialmente é de origem visceral e localização imprecisa. Aumento voluntário da tensão da parede abdominal resulta do medo de sentir dor e pode não corresponder a lesões viscerais significativas. Por outro lado, um aumento involuntário da tensão da musculatura é um sinal fidedigno de irritação peritoneal. Da mesma forma, dor bem caracterizada à descompressão súbita é sinal inequívoca de peritonite.
• Toque Retal
O toque retal é um item importante da avaliação abdominal. Os objetivos básicos do toque retal nos traumas penetrantes são : detecção da presença de sangue na luz intestinal, que é indicativa de perfuração intestinal, e a avaliação do tônus do esfíncter anal para estimar a integridade da medula espinhal. Após uma contusão abdominal, a parede do reto também deve ser examinada na tentativa de se palpar fragmentos ósseos e para se avaliar a posição da próstata. Quando a próstata está elevada e flutuante, tal dado sugere a possibilidade de ruptura da uretra posterior.
• Toque Vaginal
Lacerações da vagina podem ser devidas a traumas penetrantes ou a fragmentos ósseos de fraturas pélvicas.
• Exame do Pênis
A presença de sangue no meato uretral deve levantar a suspeita de laceração da uretra.
Sondagens
• Sondagem Nasogástrica
Tem finalidades diagnóstica d terapêutica. O objetivo principal é o esvaziamento do conteúdo gástrico, reduzindo a pressão e o volume do estômago e a possibilidade de broncoaspiração. A presença de sangue nas secreções aspiradas, excluída uma fonte nasofaringeana de hemorragia, sugere lesão alta do trato gastrointestinal. Cuidado : na presença de fraturas de face, a sonda deve ser introduzida pela via oral para prevenir a sua introdução acidental no interior do crânio, através de uma fratura da placa crivosa.
• Cateterismo Vesical
A função principal é a descompressão da bexiga e a monitoração da perfusão tecidual, por intermédio da medido do débito urinário. A hematúria é um sinal importante de possível trauma genitourinário. A urina coletada pode ser utilizada na detecção laboratorial de drogas. Cuidado: antes da introdução da sonda, o reto e os genitais devem ser examinados, visando detectar sinais que contra-indiquem a sondagem. Elevação da próstata ao toque retal e a presença de sangue no meato uretral ou de hematomas escrotais ou perineais contra-indicam o procedimento até que uma uretrografia retrógrada confirme a integridade da uretra.
Ferimentos por Arma Branca (FAB)
Neste caso não é difícil a identificação do tipo de ferimento, já que suas bordas são regulares e geralmente retilíneas. Um pouco de dificuldade encontra-se nos casos de ferimentos por estilete, onde as lesões na pele são puntiformes.
É freqüente que os pacientes vítimas de arma branca cheguem ao hospital com exteriorização de epíploon ou mesmo de vísceras pelo local do ferimento. Neste caso, nunca se deve reduzir o conteúdo novamente para o interior da cavidade abdominal , pois tais estruturas em contato com o meio externo já estão contaminadas. O importante é a proteção com compressas úmidas e a preparação do paciente para a laparotomia exploradora.
Há pacientes que chegam ao hospital ainda com a arma branca introduzida, nestes a conduta que sempre deve ser evitada é a retirada na sala de admissão. Estes pacientes, após as medidas iniciais e se as condições clínicas o permitirem, devem ser encaminhados para estudo radiológico com o intuito de saber o tamanho, o trajeto e a posição da ponta da arma. Só após isso o paciente deve ser encaminhado ao centro cirúrgico.
O que determinará a indicação de laparotomia exploradora é a penetração da arma branca através do peritônio parietal (parede ântero-lateral) ou da musculatura lombar (parede posterior). Para caracterizar a penetração , vários métodos foram descritos, como passagem de sondas pelo orifício de penetração da arma branca, fistulografia, exploração local com instrumentos cirúrgicos como pinças tipo Kelly e outros. Sabe-se, porém, que quando o paciente é vítima de agressão por arma branca existe a contração dos vários músculos que compõem a parede do abdome e, após o relaxamento, o trajeto geralmente não será retilíneo, devido ao deslizamento destas camadas musculares entre si. Com isso é muito difícil que ele seja totalmente permeável a sondas ou instrumentos cirúrgicos.
O melhor método que serve para saber se um ferimento é penetrante ou não é a exploração cirúrgica sob anestesia local com técnica asséptica. Se o ferimento for pequeno, ou mesmo nos casos de ferimento puntiforme, a melhor conduta é a sua ampliação sob anestesia local e com a ajuda de afastadores tipo Farabeuff observar se houve ou não lesão do peritônio parietal ou da musculatura lombar. Em caso positivo, está indicada a laparotomia exploradora para saber se há ou não lesão de estruturas intra-abdominais.
Quando se tem certeza de que não houve penetração da arma branca na cavidade abdominal, a conduta é a anestesia local, lavagem exaustiva do ferimento com retirada de corpos estranhos, desbridamento de tecidos lesados ou com irrigação deficiente, hemostasia rigorosa e, se o ferimento for causado há menos de seis horas, o fechamento por planos; caso contrário apenas um curativo deve ser realizado e a ferida terá a sua cicatrização por segunda intenção, pois já é considerada contaminada. A profilaxia do tétano é obrigatória, seja o ferimento penetrante ou não.
O estudo radiológico do abdome no ferimento por arma branca geralmente não fornece informações suficientes para a indicação ou não da laparotomia exploradora. Ele poderá nos mostrar pneumoperitônio (nos casos de perfuração de vísceras ocas - principalmente estômago e cólon e, raramente, devido à entrada de ar de fora para dentro do abdome), borramento do músculo psoas devido à presença de sangue no retroperitônio, enfisema de retroperitônio (lesão duodenal), alças de delgado em íleo localizado, borramento da pequena bacia pela presença de sangue ou líquidos digestivos extravasados neste local (sinal da orelha de cachorro). Mas, como foi referido acima, a indicação de laparotomia será feita baseando-se na ultrapassagem ou não do peritônio parietal pela arma branca, podendo-se até dizer que o estudo radiológico em FAB abdominal é dispensável.
Exames para avaliar penetração ou lesão interna
• exploração digital
• radiografia simples do abdome
• trajetografia
• métodos de imagem
• lavagem peritoneal
• laparoscopia
Ferimentos por Arma de Fogo (FAF)
Neste tipo de ferimento a avaliação quanto à penetração ou não na cavidade abdominal faz-se pelo estudo radiológico nas posições “frente” e “perfil”, marcando-se o(s) orifício(s) de entrada com materiais radiopacos, como, por exemplo, moedas presas com esparadrapo com o intuito de estabelecer, a partir do orifício de entrada, a trajetória do projétil e poder inferir sobre a(s) estrutura(s) atingida(s). Isso é de grande valia quando não há orifício de saída. Se o estudo radiológico mostrar que o trajeto é penetrante, está indicada a laparotomia exploradora. Em caso de dúvida, é melhor realizar uma laparotomia “branca”, isto é, não encontrar lesões intra-abdominais, do que ficar em dúvida e deixar passar lesões que, se operadas tardiamente, podem levar a quadros abdominais graves.
Logicamente, nos casos onde a irritação peritoneal estiver presente, a indicação de laparotomia exploradora é obrigatória, sendo o exame radiológico do abdome um exame importante para o estabelecimento da provável trajetória do projétil, principalmente nos casos onde o projétil ainda permanecer no interior do paciente.
É importante lembrar que :
- até que se prove o contrário, toda lesão abdominal aberta deve ser considerada penetrante;
- lesões na parte inferior do tórax, períneo ou nádegas podem ter atingido o abdome, logicamente dependendo do tamanho da arma branca ou da trajetória de arma de fogo.
Ferimentos por Arma de Fogo (FAF) Neste tipo de ferimento a avaliação quanto à penetração ou não na cavidade abdominal faz-se pelo estudo radiológico nas posições “frente” e “perfil”, marcando-se o(s) orifício(s) de entrada com materiais radiopacos, como, por exemplo, moedas presas com esparadrapo com o intuito de estabelecer, a partir do orifício de entrada, a trajetória do projétil e poder inferir sobre a(s) estrutura(s) atingida(s). Isso é de grande valia quando não há orifício de saída. Se o estudo radiológico mostrar que o trajeto é penetrante, está indicada a laparotomia exploradora. Em caso de dúvida, é melhor realizar uma laparotomia “branca”, isto é, não encontrar lesões intra-abdominais, do que ficar em dúvida e deixar passar lesões que, se operadas tardiamente, podem levar a quadros abdominais graves. Logicamente, nos casos onde a irritação peritoneal estiver presente, a indicação de laparotomia exploradora é obrigatória, sendo o exame radiológico do abdome um exame importante para o estabelecimento da provável trajetória do projétil, principalmente nos casos onde o projétil ainda permanecer no interior do paciente. É importante lembrar que : - até que se prove o contrário, toda lesão abdominal aberta deve ser considerada penetrante; - lesões na parte inferior do tórax, períneo ou nádegas podem ter atingido o abdome, logicamente dependendo do tamanho da arma branca ou da trajetória de arma de fogo. Lesões mais freqüentes
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Trauma Abdominal Fechado
A abordagem diagnóstica será realizada de maneira diferente, já que não existem lesões externas que possam ser exploradas, como no ferimento por arma branca, e também não existe trajetória de projétil como no ferimento por arma de fogo. Aqui, o exame clínico e os parâmetros hemodinâmicos aliados à observação clínica evolutiva do paciente é que orientam quanto a necessidade ou não de laparotomia exploradora.
Se o paciente estiver consciente e, portanto, apto a fornecer dados de história em relação ao trauma e em relação à sua sintomatologia, e juntarmos a esses dados o exame físico do abdome, poderemos, na grande maioria dos casos, ter segurança na indicação da laparotomia exploradora.
Nos casos em que o paciente está inconsciente ou com o grau de consciência diminuído (associação com trauma crânio-encefálico), pacientes alcoolizados ou drogados), naqueles portadores de trauma de coluna com lesão medular ou nos pacientes com hipovolemia inexplicada, é obrigatória a realização da lavagem peritoneal diagnóstica e/ou de outros exames especializados (ultrassonografia, tomografia computadorizada, laparoscopia), visto que o exame clínico estará muito prejudicado. Deve-se notar que a punção abdominal também é um método diagnóstico que pode ser realizado, mas com uma sensibilidade bem inferior à lavagem peritoneal diagnóstica.
O exame radiológico do abdome poderá mostrar alguns sinais como velamento de pequena bacia ou a presença de líquido entre alças, denotando extravasamento de líquidos no interior da cavidade abdominal (sangue ou sucos digestivos), íleo reacional localizado, desaparecimento da borda do músculo psoas, fratura de bacia, etc.
A ultra-sonografia de abdome é um ótimo exame para identificação de lesões em órgãos parenquimatosos como fígado, baço, rins e pâncreas, além de poder identificar a presença de líquido no interior da cavidade abdominal.
Quanto à tomografia computadorizada, ela também é um excelente exame para órgãos parenquimatosos, mas existe a limitação quanto ao seu alto custo e a necessidade de pessoal especializado para a sua execução.
Outro procedimento diagnóstico que tem sido útil na caracterização da presença ou ausência de lesões viscerais é a laparoscopia. Este procedimento tem permitido avaliar a extensão de lesões esplênicas e hepática, o volume de sangue presente na cavidade peritoneal, a existência de hematomas retroperitoneais, orientando com precisão a escolha do tratamento mais adequado.
Unindo-se dados de história (quando possível), exame físico apurado, observação clínica rigorosa e procedimentos complementares, consegue-se, na grande maioria dos casos, indicar ou não a laparotomia exploradora nos casos de trauma abdominal fechado.
Lesões mais freqüentes
Órgãos Freqüência | ( % ) |
Baço | 41,4 |
Fígado | 24,6 |
Intestino delgado | 7,2 |
Rim | 6,0 |
Bexiga | 5,4 |
Colo | 4,2 |
Diafragma | 3,9 |
Mesentério | 2,9 |
Pâncreas | 1,3 |
Vias biliares | 1,1 |
Estômago | 0,62 |
Duodeno | 0,62 |
Veia cava | 0,19 |
Artéria renal | 0,19 |
Referências Bibliográficas
1. RASSLAN,S. - Trauma Abdominal. Afecções Cirúrgica de Urgência, 293:304, 1995
2. BIROLINI,D. UTIYAMA,E. STEINMAN,E. - Abordagem diagnóstica e terapêutica no trauma abdominal. Cirurgia de Emergência, 201:207, 1996
3. Advanced Trauma Life Support (ATLS)
Fonte: http://estudmed.com.sapo.pt/traumatologia/trauma_abdominal_1.htm
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